Dolorosa necessidade. Cai o homem, a sociedade caminha. Custa às vezes lágrimas o progresso. Impõe sofrimentos a justiça. É lei da humanidade. Com o desenvolvimento porém da civilização dilata-se a força dos governos, armam-se de novas faculdades os poderes públicos, derrama-se a moralidade, difunde-se a instrução, alarga-se a publicidade, e por tal arte cresce, e se levanta o poder da sociedade, que pareceria estranha fraqueza declinar para a jurisdição do algoz a decisão do conflito travado entre a inocência e o crime. Que a sociedade se defenda razão é, mas que podendo defender-se sem imolar à sua conservação a vida dos delinquentes, imponha desnecessariamente a pena de morte, não o explica facilmente a ciência penal dos nossos dias.
E aqui associa-se a voz da humanidade e do sentimento a confirmar os ditames da ciência e as tendências da civilização. Levantam-se as assembleias legislativas contra o carrasco, instrumento brutal nas mãos da lei, que o obriga a matar sem consciência, a ferir sem ódio, a punir sem responsabilidade, a verter sangue onde pudera derramar bálsamo a religião, e lançar raízes o remorso.
Os argumentos ditados pela ciência e pelo sentimento são corroborados pelo testemunho dos factos. A estatística, registo dos acontecimentos sociais, incumbe-se de documentar com o testemunho insuspeito dos algarismos a desnecessidade da pena de morte no estado atual da sociedade. Onde os costumes dispensaram por inútil aquele meio de repressão, não se acrescentou a criminalidade, nem baquearam os poderes públicos assoberbados pela audácia do crime e pela inseguridade da vida e da propriedade, antes com a moralização dos costumes, com o derramamento da instrução, com o desenvolvimento da publicidade, com o aperfeiçoamento das medidas preventivas e repressivas, e com a certeza do castigo, tem diminuído a perpetração dos crimes mais graves.
Factos em abono do que deixo exposto não faltam. Temo-los perto de nós.
A pena de morte esta abolida de facto entre nós desde muitos anos. Fez-se a última execução em abril de 1846. Desde então até hoje não tem aumentado a criminalidade, como se pode ver pelo mapa que acompanha esta proposta de lei.