E porque, como diz um escritor celebre, na época de exame social em que nos achamos, não é para admirar que a consciência do género humano, que tem, como a do indivíduo, suas duvidas, suas inquietações e seus remorsos, se interrogue sobre uma das mais terríveis ansiedades da sua legislação, e pergunte a si própria, se há uma virtude social no sangue derramado, se o verdugo é o executor de uma espécie de sacerdócio da humanidade, e se é certo que o cadafalso seja a ultima razão da justiça.
Enquanto à pena de morte, há escritores que sustentam a sua absoluta legitimidade, e que por isso concedem aos poderes sociais o direito de empregar tal pena quando o tiverem por conveniente; outros negam absolutamente que seja legítima, e por isso negam também do mesmo modo àqueles poderes o direito de a aplicar; outros finalmente, seguindo um meio termo, entendem que ela se não pode dizer absolutamente legítima, nem ilegítima, mas que pode ser relativamente uma e outra coisa; legítima, quando é necessária para a conservação da ordem social; ilegítima, quando o não é.
A comissão pois adota, com a maior satisfação, a doutrina do artigo 1.° da proposta, pelo qual é abolida a pena de morte nos crimes civis, pois que, ainda supondo-se que à sociedade pertença o terrível direito de empregar tal pena, a experiência de mais de vinte anos, em que se acha entre nós abolida de facto, a sua abolição também de direito nos crimes políticos, a brandura e suavidade dos nossos costumes, a repugnância que em geral têm os jurados, juízes e tribunais na sua aplicação, os graves inconvenientes resultantes deste antagonismo das leis que a conservam, e dos costumes e opinião pública que a querem abolida, a consideração de que, adotado o sistema de prisão celular que se propõe, e acomodadas a ele as nossas cadeias, a sociedade não fica privada dos meios necessários de repressão, ainda que do numero deles seja riscada aquela pena, tudo nos leva a crer que é chegada a hora feliz em que, sem perigo, podemos com inteira confiança introduzir na nossa legislação penal esta humanitária reforma.