Estado Novo

Sessão de 4 dezembro 1937

http://debates.parlamento.pt/catalogo/r2/dan/01/01/04/150/1937-12-04/210?q=%2522pena%2Bde%2Bmorte%2522&pOffset=50&pPeriodo=r2

O Sr. José Cabral: – Sr. Presidente: vou mandar para a Mesa um projeto de alteração do n.º 11.º do artigo 8.º da, Constituição. Sem querer desde já lixar a atenção da Assembleia sobre um problema muito complexo, como o que envolve este projeto de alteração à lei constitucional, quero no entanto dizer que, por ele, me proponho tornar possível a modificação, ou, melhor, a ampliação da nossa escala penal, introduzindo nela duas categorias novas, constituídas pela pena capital e pela de trabalhos públicos.

Talvez convenha esclarecer a Assembleia sobre as principais determinantes desta minha iniciativa. Ela vai, certamente, de encontro a um conjunto de preconceitos, porventura respeitáveis, de há muito enraizados em muitos bons espíritos.

Visto o problema no aspeto filosófico propriamente dito, sei perfeitamente que muita gente boa do nosso País sente tanto pela pena de morte, como pelas de caráter perpétuo, uma viva e compreensível repugnância. Repugnância, entendamo-nos pela inclusão destas penas na escala penal comum.

Mas para mim o problema não é apenas de caráter filosófico ou jurídico; é mesmo, e unicamente, um problema, social e político. Por consequência, o que possa pensar-se do problema encarado no primeiro aspeto não pode influir na solução que o meu espírito encontra, para ele, visto à luz do segundo.

É claro que não vou fatigar a Assembleia, desfiando aqui, agora sobretudo, o interminável rosário de argumentos pró e contra tais penas, que toda a gente conhece. Mas não resisto à tentação de dizer que algumas dessas razões as considero decisivas e que uma delas – talvez a mais impressionante – é esta: só o Estado tem o direito de mandar para a guerra, que o mesmo é dizer para a morte, milhares e milhares dos seus melhores cidadãos, os mais fortes e os mais patriotas, penso que ninguém pode contestar-lhe o de condenar à morte alguns dos piores.

O fundamento do seu direito é nos dois casos o mesmo – a legítima defesa.
Julgo que este argumento, despido de artifícios e, assim, reduzido a uma fórmula simples, não pode deixar de impressionar V. Ex.ªs como me impressiona a mim.

Se outros não houvesse – e são inúmeros -, talvez este bastasse para me resolver a propor à Assembleia a resolução do problema tal como se contém no meu projeto.

Um projeto de lei tendente a ampliar a nossa escala penal com mais as duas categorias a que acabo de referir-me não poderia porém ser apresentado, visto que a isso se opõe o já citado preceito da Constituição, que estabelece que no nosso País não haverá penas perpétuas, nem pena de morte, exceto, quanto a esta, o caso de guerra.